quarta-feira, 9 de maio de 2007

O mistério das questões colaterais

O desaparecimento da criança inglesa na Praia da Luz choca qualquer ser humano com o mínimo de sentimentos. Ora, e apesar dela ter desaparecido, importa esclarecer algumas questões relacionadas com essa situação.

Assim, a primeira está relacionada com a solidariedade, a humanidade e a decência da esmagadora maioria dos habitantes daquela localidade que, e desde o início ficaram preocupados com o desaparecimento da criança, participam nas buscas na tentativa (cada vez mais longínqua na minha opinião) de a encontrar.

Outra questão colateral está relacionada com as afirmações de um advogado sobre a eventual prática de um crime de exposição ou abandono, o qual, e apenas a título de curiosidade, é previsto e punido nos termos do disposto no artigo 138º do Código Penal, sendo que as afirmações, na minha humilde opinião, ultrapassam o politicamente mais que incorrecto.

Desde logo porque, e ainda que essas afirmações sejam proferidas por pessoas ditas comuns, já revelam uma tremenda falta de bom senso, de sensibilidade e de tacto. Agora quando são proferidas por um erudito na ciência das leis, o caso muda radicalmente de figura.

Ora, e não querendo entrar na discussão do preceito legal em causa uma vez que o Direito Penal não é, de todo, a minha área de eleição, permitam-me referir uma lição que aprendi numa das primeiras aulas de Introdução ao Estudo do Direito, logo no 1º ano da faculdade. Foi-me dito pelo Professor que só deveríamos falar sobre os assuntos se tivéssemos conhecimento dos seus factos.

Tenho uma certeza quase absoluta que o referido advogado não conhece, nem de perto nem de longe, quais os factos já carreados para o inquérito, assim como eu não os conheço, pois se os conhecesse teria havido uma clara violação do tão famoso segredo de justiça.

Paralelamente, é minha opinião que o Ministério Público não necessita, na esmagadora maioria das vezes, de indicações, sugestões ou orientações de terceiros estranhos, quanto à forma como há-de dirigir o inquérito, pelo que todas as afirmações que essas pessoas possam proferir, e tentando ser simpático, poderão ser qualificadas como inoportunas.

Quanto à questão colateral do segredo de justiça, e apesar de fazer as minhas apreciações, sugiro a leitura deste post e dos respectivos comentários.

Assim, muita gente está chocada com o facto de imperar o segredo de justiça nesta situação. Para o bem e para o mal, a lei exige que, e quando qualquer inquérito seja aberto pelo Ministério Público esteja desde logo sujeito a esta figura jurídica, seja por razões de privacidade, de protecção da intimidade do arguido, do queixoso, das testemunhas, das provas. Whatever...

O que importa esclarecer é que ele vigora, e ponto final. Outra questão é saber se ele é cumprido, e parece-me que nesta situação está, para grande tristeza e desespero da curiosidade mórbida e hipócrita dos jornalistas, sejam eles portugueses, ingleses ou de qualquer outra nacionalidade, assim como para o comum dos mortais, os quais não percebem que não se pode falar das diligências probatórias já realizadas ou a realizar, dos factos já apurados. No entanto, julgo que nada impediria a Polícia ou o Ministério Público de darem alguns esclarecimentos quanto o andamento do processo.

Quanto à questão colateral da actuação da Polícia, existem acusações de falta de acção por parte das várias forças empenhadas na investigação por parte dos tablóides ingleses (os equivalentes a esse jornal português de grande qualidade que responde pelo nome de 24 Horas), assim como por outros cidadãos ingleses.

Ora, confundir a dita acção pouco visível da Polícia com a falta de informações que esta entidade possa prestar, é passar um atestado de incompetência a todos nós. Com certeza que a Polícia Inglesa forneceu aos jornalistas ingleses informação detalhada sobre o processo relativo aos atentados em Londres ou sobre o assassínio de um cidadão brasileiro no metro londrino por ter sido confundido com um terrorista. Então neste último caso é que a polícia daria toda a informação para então se apurar que tinha havido uma falha clamorosa da parte dela...

Portanto, os jornalistas ingleses não se armem virgens ofendidas porque todos temos as nossas limitações. Eles os erros clamorosos e mortes ditas "acidentais", e nós o segredo de justiça. Mal ou bem, prefiro o segredo de justiça, ele não se engana e não tira vida a pessoas, por engano.

Por fim, e quero acreditar que sim, importa referir que todas as entidades envolvidas, incluindo o povo daquela localidade, estão a dar o melhor para encontrar o mais rapidamente possível a criança.

6 Comments:

At 23:58, Anonymous Anónimo said...

No meio deste emaranhado de questões colaterais, surgiu-me uma interrogação relativa à suposta incompetência da polícia portuguesa. Será que a polícia britânica já se esqueceu daquele caso das duas meninas que desapareceram e que foram encontradas, mais tarde, (os mais sensíveis que me perdoem a crueza da expressão) "mortas e enterradas"??? Será que nessa altura, em que a polícia britânica andava feita barata tonta sem saber onde procurar e como agir, não haveria incompetência???

Oh meus senhores, vamos lá a ter um pouco de consciência, e tento na língua já agora, e parar de criticar o trabalho daqueles que nos últimos dias têm dado tudo por tudo para encontrar a menina...

Quanto aos pais prefiro não comentar, até porque nada de bom posso dizer de dois adulto que deixam 3 crianças sozinhas daquela forma...

Bjs

 
At 13:53, Blogger Bigmac said...

Carissimo Pedro a relevancia deste post é altissima. Fico triste por uma criança e pela emoção que os pais sentem numa hora destas, é aflitivo. Fico ainda mais triste porque um caso que se passa com uma familia estrangeira com grande influência mediática venha sobrepor-se ás necessidades e hábitos nacionais. Estas pessoas são autênticos Ingleses, estúpidos e insensíveis. Ninguém com minimo senso deixa sozinhas 2 crianças com 2 anos e uma com 3. Nenhum povo deve deixar que o alvo das criticas recaia sobre a eficácia da policia Portuguesa. Ainda mais tristes estão os outros pais a quem desapareceram crianças e que alegam que foram visitados por 2 ou 3 policias e que nada mais souberam do caso. Deixemos de ser subservientes aos outros, Portugal não deve ser só praia, vinho do Porto e vinho Madeira. Critiquem esses pais que nunca foram, não deixando de fazer todos os esforços para encontrar a criança.

Peço desculpa pelo desabafo no teu espaço.

Aproveito para pedir a tua colaboração e dos leitores deste blog para outra situação:

http://fasesdaluacheia.blogspot.com/2007/05/denuncia.html

Obrigado

 
At 14:08, Blogger Pedro said...

O problema é que quem levanta a (falsa) questão da alegada incompetência da Polícia portuguesa são os jornalistas ingleses.

Será que eles pensam este cantinho à beira mar plantado ainda está subjugado aos ditames de Sua Majestade. Enganam-se redondamente.

Portanto, deixem-se estar sossegados na sua ignorância saloia em que vivem, uma vez que pensam que o Império Britânico ainda subsiste.

Hello!!! Acordem para a vida! Inglaterra é Inglaterra, Portugal é Portugal. Portanto, deixem trabalhar a Polícia.

Entretanto, e já que os jornalistas só estão interessados em criticar, que tal darem uma ajuda a todos aqueles que participam nas buscas.

Assim sempre seriam mais úteis!

 
At 14:18, Blogger Pedro said...

Caríssimo BigMac,

Concordo inteiramente contigo. A angústia, o sofrimento e a dor devem ser insuportáveis nesta hora.

De qualquer modo, o facto dos Pais terem deixado os filhos de tenra idade sozinhos em casa é sempre um pau de dois bicos.

É claro que se deve criticar esta actuação, a qual deve servir de exemplo para todos os outros pais como uma coisa a NÃO fazer, seja em casa, na rua ou onde quer que seja...

Se calhar já não se lembram dos distúrbios praticados pelos adeptos ingleses num jogo do Man Utd no Porto ou em Albufeira durante o Euro 2004.

Pois bem, nessas situações a Polícia, que hoje é criticada, resolveu com eficácia e rapidez os casos de distúrbio, apesar de, e na primeira situação, terem existido protestos por parte do Embaixador do Reino Unido.

Agora, em vez de os ver a criticar, que tal darem o corpo ao manifesto e ajudarem nas operações de busca? Isso sim, isso é que os gostava de ver a fazer...

Abraços

 
At 19:14, Blogger foryou said...

É triste que ainda existam pais que "facilitam", mas não tenho dúvidas da angústia e por isso mesmo espero que resgatem a criança.

Entendo algumas criticas feitas quanto aos esforços relativamente a esta criança em comparação com outros casos de desaparecimento. O que não invalida que considere positiva a mobilização em referência.

Quanto ao segredo de justiça, não o contesto. É para mim lógico que não sejam divulgados dados que possam pôr em causa a solução.

Ingleses?... No comments (antes que me saia alguma disparada e seja impedida de aqui voltar)

 
At 09:03, Blogger Pedro said...

Foryou,

Nem quis entrar por esse assunto, o qual tem toda a sua relevância e importância.

Agora, e quanto à actuação da polícia, julgo, e quero acreditar, que tem sido a melhor.

Por fim, e quanto aos ingleses podem ser feitos todos os comentários que quiseres, mesmo aqueles que sejam disparatados...

 

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